Questione a forma como você vê o mundo

Você já se perguntou se os seus olhos realmente enxergam o mundo ou apenas repetem o que foram treinados para ver? O modo como percebemos a realidade está intimamente ligado ao que nos foi ensinado — e, muitas vezes, ao que nos foi imposto.

Na perspectiva de Nêgo Bispo, pensador quilombola do Piauí, o saber dominante ocidental nos alienou da Terra ao transformar tudo em objeto, inclusive o tempo e a vida. Ele propõe um pensamento “contracolonial”, no qual o tempo não é linear e a natureza não é recurso, mas parente. Bispo nos convida a cultivar um outro modo de existir, onde ver o mundo é também cuidar dele — e se deixar afetar por ele. Ele afirma: “O problema não é a colonização da terra, é a colonização da mente.”

Autores decoloniais como Boaventura de Sousa Santos, Gloria Anzaldúa, Achille Mbembe e Ailton Krenak também denunciam a centralidade do olhar europeu como única lente legítima, por exemplo. Propõem múltiplas epistemologias: olhares ameríndios, africanos, feministas, espirituais e populares como formas legítimas de construir o mundo. Como defende Krenak: “Precisamos adiar o fim do mundo” — e isso exige imaginar outros mundos possíveis, com outros modos de ver e sentir.

Por um lado, vestígios da colonialidade não atua apenas nas estruturas políticas e econômicas: ela molda nossos afetos, nossos desejos e até nossas paisagens internas. Por outro, a neurociência confirma: nossa percepção é condicionada por padrões neurais de repetição. O cérebro filtra estímulos para reforçar aquilo que já conhecemos — o que significa que, sem esforço e insistência, continuamos vendo o mesmo mundo, mesmo quando o mundo já mudou.

No entanto, é possível mudar esses padrões: a plasticidade cerebral permite a criação de novas conexões a partir de novas experiências sensoriais, emocionais e cognitivas. Portanto, experimente mudar o olhar. Olhe como se fosse a primeira vez para o seu trajeto cotidiano, como quem procura por novidades, novas cores, belezas, texturas, melhorias e imperfeições. Como o seu corpo se movimenta e sente-se neste ambiente?

Esse simples exercício pode reconfigurar as sinapses cerebrais, quebrar automatismos e abrir espaço para um olhar mais atento, sensível e conectado. É também um gesto político: ver diferente é o primeiro passo para agir diferente, exigir o que falta e, sobretudo, quem sabe, se propor a ser protagonista..

Em tempos de emergência climática e colapso das certezas, precisamos reinventar não só o mundo, mas a forma como o percebemos. Descentralizar o olhar é um ato radical de preservação: de nós, da vida e da Mãe Natureza.

Tamires Santana

Assessora de Comunicação HEFC

Total Page Visits: 52 - Today Page Visits: 1
Social media & sharing icons powered by UltimatelySocial
Facebook
Facebook
YouTube
Instagram
Open chat
1
Olá! Agradecemos por estar aqui. Como podemos te ajudar?